Abrir mão de um subsídio mensal no valor de R$ 12 mil, não construir nenhum patrimônio financeiro ao logo de três mandatos parlamentares e não beneficiar os parentes com cargos na Assembleia Legislativa ou qualquer outro órgão público. Será que isso é possível num país com tanta corrupção, com lavagem de dinheiro e uso irregular da máquina pública? A resposta pode ser respondida pelo deputado estadual paraibano Frei Anastácio. O parlamentar diz que é possível viver com simplicidade e nos passa a receita de exercer um cargo público sem precisar se corromper tendo um ideal de vida.
“Não possuo nada no meu nome, mas sou muito feliz e realizado. A política não é o essencial na minha vida, o essencial na minha vida é ser frade, é uma questão de opção. A política é uma forma de ajudar as pessoas, e principalmente os agricultores paraibanos. Um exemplo são as 37 famílias que acompanho a 30 anos, num assentamento na ponta de Gramame, entre outros assentamentos que ajudamos espalhados pelo Estado”.
Mesmo sabendo que a política está em segundo plano, Anastácio faz questão de chamá-la de instrumento de transformação que pode mudar a realidade de uma sociedade. “Tenho consciência que é importante a comunidade de base, os sindicatos, as associações, as organizações, mas quem determina o rumo da sociedade e das pessoas é a política. Ela pode ser um instrumento de mudança que ajuda ao povo nas organizações e também pode ser um instrumento de corrupção”.
Essa corrupção o parlamentar explica que está dentro de todos os órgãos públicos basta observarmos o que ‘acontece nos bastidores’. Ele contou que já recebeu uma proposta para melhorar seu salário de parlamentar, mas não deu nenhuma pista de quando (qual dos mandatos parlamentar recebeu essa proposta), nem quem teria feito. “Já fizeram uma proposta indecente de aumentar o salário. Não foi somente eu que recebi, e disse que se acontecesse iríamos denunciar, então eles não falaram mais”.
O caminho encontrado por Anastácio para trilhar sua vida política foi abrir mão de tudo que recebe, praticando o mesmo que já vinha sendo feito na província franciscana, no seminário em Lagoa Seca, local onde estudou primeiramente, depois numa faculdade no Recife, Estado de Pernambuco. E, através da religião realizou vários trabalhos como franciscano em comunidades carentes.
“Entrei na Província Franciscana de Santo Antônio, em 1965, aos 18 anos. Trabalhei e me aposentei na província. Não recebo nenhum dinheiro, o salário de R$ 12 mil é dividido: mando R$ 6 mil para a província, coloco R$ 1,2 mil na caixa da Comunidade no convento e passo quase R$ 3,5 mil para o PT. Depois pago o seguro da Toyota que comprei e está em nome da província. Já a verba de gabinete e verba social é administrada pelo gabinete. O maior salário no gabinete é de R$ 5 mil, do Chefe de Gabinete Nino, os outros assessores não chegam a tanto. Também tenho quatro advogados, dois para a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e dois para o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST)”.
A política surgiu na vida do Frei através dos trabalhos religiosos desenvolvidos nas comunidades rurais da Paraíba. Quando começaram os conflitos no Litoral Sul, nas cidades de Alhandra, Caaporã, Conde e Pitimbu o envolvimento de Anastácio com a política começou. A igreja foi contaria a decisão de Anastácio ser candidato porque achando que ele poderia se corromper estando dentro da política.
“Ajudei a criar todas as equipes de CPT do Estado, em João Pessoa, Campina Grande, Guarabira e Cajazeiras. Por esse envolvimento quando chegava o período de mudança, ou capitulo como é conhecido na vida de um frade o arcebispo dom José Maria Pires sempre pedia que eu ficasse. Antes de 1998 começamos a fazer um debate sobre a participação dos agricultores na política partidária, as discussões eram que os trabalhadores conquistavam a terra, mas no tempo de eleição elegiam o que tinha de pior para a Assembléia Legislativa, para as prefeituras e o resto. E, então colocaram meu nome porque o povo confiava e fui candidato ocupando pela primeira vez uma cadeira na Assembleia”.
Ser político não é tão fácil para quem assume uma vida religiosa, por isso antes de ser candidato Anastácio precisou comunicar sua decisão e pedir a aprovação da Província e do arcebispo. “Todos achavam no começo que eu ia querer vida boa e não concordaram, mas depois disseram que iriam respeitar a minha consciência e que não fariam campanha, nem falariam no meu nome. Já Dom José me deu os pêsames e informou que a vida iria mudar por completo ao entrar na política partidária porque era corrupta e corrompe as pessoas. O tempo mostrou que nada disso ocorreu e ainda carrego os mesmo princípios de antes”.
Ao receber a equipe do Portal PB Agora para uma entrevista o deputado Frei Anastácio mostrou a simplicidade em que vive, os trabalhos realizados dentro do convento e a esteira onde prática exercícios diários, que diz ser seu hobby. A esteira fica na biblioteca comunitária do convento.
No quarto muito simples, sem cama, apenas uma rede e várias roupas penduradas em cabides fora do guarda-roupa.
Uma estante de ferro no quarto onde guarda os livros religiosos, de teologia, de literatura brasileira e poesia.
Uma rotina que começa muito cedo e antes do café da manhã faço minhas orações com outros dois frades que vivem no convento. "Moro em um convento com outros frades e tenho uma rotina diária. Acordo todos os dias às 4 horas da manhã e começo a trabalhar no meu quarto.
Entro na internet e respondo os e-mails enviados. Não tenho cama, durmo de rede há mais de 30 anos. Também arrumo e passo pano todos os dias no quarto antes de ir para a Assembleia”.
No quintal do convento Frei Anastácio e os outros frades criam galinhas, bodes e coelhos.
Edinho Trajano, com Gledjane Maciel